Em 2012, foram os gastos dos trabalhadores que sustentaram a pequena, porém positiva, variação do PIB, de 0,9% em relação ao ano anterior, e impediram recuo no PIB per capita, que se manteve estável em relação a 2011
O instigante economista polonês Michal Kalecki (1899-1970) ficou muito conhecido por sua teoria da dinâmica econômica e análise sobre os ciclos econômicos. Sua interpretação crítica da economia capitalista em países subdesenvolvidos e o papel do Estado na sustentação da demanda efetiva é ainda muito útil para países como o Brasil. Em uma frase que ficou famosa, Kalecki resumiu assim suas ideias sobre os lucros: “os capitalistas ganham o que gastam e os trabalhadores gastam o que ganham”.
Analisando os resultados do Produto Interno Bruto (PIB) do Brasil em 2012, divulgados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), vemos que os trabalhadores seguem fazendo sua parte na equação de Kalecki. Na análise da demanda, a despesa de consumo das famílias cresceu 3,1% – é o nono ano consecutivo de crescimento deste componente. Tal comportamento foi favorecido pela elevação de 6,7% da massa salarial dos trabalhadores, em termos reais, e pelo acréscimo, em termos nominais, de 14% do saldo de operações de crédito do sistema financeiro com recursos livres para as pessoas físicas. A despesa de consumo da administração pública, por sua vez, aumentou 3,2%.
A possibilidade dos trabalhadores gastarem decorre, em grande parte, da ação coletiva de seus Sindicatos. Em 2012, aproximadamente 95% das 704 unidades de negociação analisadas pelo DIEESE conquistaram aumentos reais de salários, na comparação com a evolução do Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC) do IBGE. Este bom resultado reflete também o acerto da política de valorização de longo prazo do salário mínimo, fruto de acordo entre o Governo Federal e as Centrais Sindicais, em 2007, e que garantiu ao piso nacional ganho real acumulado de 70,5% desde 2002.
Já a formação bruta de capital fixo – o investimento na equação de Kalecki – apresentou queda de 4% em 2012, puxada pelo recuo da produção interna de máquinas e equipamentos. A taxa de investimento no ano de 2012 foi de apenas 18,1% do PIB, inferior à taxa referente ao ano anterior, de 19,3%.
Ou seja, em 2012, foram os gastos dos trabalhadores que sustentaram a pequena, porém positiva, variação do PIB, de 0,9% em relação ao ano anterior, e impediram recuo no PIB per capita, que se manteve estável em relação a 2011.
Para 2013, a tendência é que as negociações mantenham os históricos patamares conquistados em 2012. O cenário externo ainda é de crise nas economias centrais do capitalismo – Europa, sobretudo – o que produz incertezas e afeta as decisões de investimento de poderosas corporações transnacionais cujas matrizes estão na União Européia. A situação econômica interna, apesar disso, é claramente mais positiva. O ritmo de crescimento econômico neste primeiro trimestre já permite sinalizar um PIB anual de pelo menos 3%. A taxa de câmbio está mais adequada para a elevação das exportações e para a inibição da importação de produtos industriais, embora o País ainda careça de uma necessária política de controle de capitais. A taxa básica de juros (Selic), em termos reais, está no seu menor patamar histórico, embora ainda elevada em um contexto global de taxas negativas. A inflação, cujos índices mantiveram-se elevados no primeiro trimestre do ano, tende a ficar dentro da meta estabelecida pelo governo pelo décimo ano seguido. E a taxa de desemprego, variável fundamental nas negociações coletivas, está no menor patamar da história.
Já os investimentos privados parecem ainda não decolar, apesar das diversas medidas econômicas adotadas pelo governo para estimular os gestores das empresas: redução nos juros, redução nas tarifas de energia elétrica, readequação cambial e desoneração das folhas de pagamento. Note-se que estas diversas ações positivas do Governo poderiam ser mais eficazes se tivessem referência num projeto nacional de desenvolvimento amplamente debatido e apoiado pela população, especialmente pelos Sindicatos. Isso tornaria estas ações mais coordenadas entre si e mais previsíveis, o que facilitaria os cálculos empresariais para deslanchar investimentos privados.
E um projeto nacional que transforme o crescimento econômico em efetivo desenvolvimento certamente precisa enfrentar fatores estruturais da economia brasileira que dificultam o gasto produtivo: a crescente desnacionalização de setores inteiros da economia, que desloca para o estrangeiro as decisões empresariais; a dependência de subsídios do Estado ao investimento privado; os oligopólios e monopólios que controlam setores estratégicos da economia, desde a indústria até o comércio; a possibilidade de que poderosas corporações estejam segurando investimentos para forçar o Estado a retomar privatizações, especialmente nos setores de petróleo e gás e infra-estrutura.