Trabalho Decente e Desenvolvimento
Thomaz Ferreira Jensen
A primeira década do século XXI se encerra para o mundo do trabalho na região do ABCD paulista, local de origem política do ex-presidente Lula, melhor do que começou, em sintonia com o ritmo de crescimento econômico e os avanços decorrentes no emprego e na renda verificados no Brasil.
Dados mais recentes da Pesquisa de Emprego e Desemprego do DIEESE e da Fundação SEADE ajudam a ilustrar este cenário positivo e chamam a atenção para os desafios que persistem para os próximos anos.
A taxa de desemprego total na região está em 11,6% – são cerca de 162 mil trabalhadores desempregados – e deve fechar a década no menor nível desde o ano 2000, quando 18,7% dos trabalhadores do ABCD estavam desempregados.
O desemprego ainda atinge de forma muito acentuada os jovens entre 18 e 24 anos de idade – a taxa de desemprego para esta faixa está em 19,9% depois de ter chegado a 30,5% em 2003 – e as mulheres, cuja taxa está em 14,7% enquanto a taxa para os homens está em 9%.
Do total de 1,23 milhão de trabalhadores ocupados no ABCD, 27% estão empregados nas indústrias da região, com destaque para o setor metal-mecânico e o químico. É o mesmo percentual de ocupados na indústria verificado no início da década. O comércio emprega 15% dos ocupados na região, com destaque para o varejo em geral. E o setor de serviços chega ao final da década empregando 49,3% do total de ocupados no ABCD. A construção civil responde por 2,2% da ocupação e o serviço doméstico por 5,9%.
Do total de ocupados, 71,4% são assalariados, dos quais 53,2% com carteira de trabalho assinada. No início da década, 44% dos ocupados tinham carteira assinada. São cerca de 122 mil trabalhadores assalariados no ABCD que trabalham sem carteira assinada, recebendo em média apenas 66% do que recebem os assalariados com carteira, além de não terem assegurado o acesso pleno aos direitos do trabalho, como férias e descanso semanal remunerado.
Em relação ao rendimento médio dos trabalhadores ocupados na região, em valores reais atualizados para setembro de 2010, os dados indicam que entre o total de ocupados o rendimento médio está em R$ 1.450, ainda abaixo dos R$ 1.533 que era o rendimento médio no ano 2000. Na indústria, o rendimento médio de R$ 1.781 registrado em 2010 representa 92% do valor médio recebido na indústria no ano 2000. No comércio o rendimento médio está em R$ 1.199 e nos serviços em R$ 1.461, ambos defasados em cerca de 7% em relação aos valores médios recebidos nestes setores no início da década.
A desigualdade de remuneração atinge de forma bastante acentuada as mulheres e os negros, em magnitude muito semelhante. Em 2010, a remuneração média das mulheres ocupadas no ABCD – R$ 1.100 – é ainda apenas 63% do valor recebido pelos homens. Os trabalhadores negros recebem, em média, R$ 1.024, ou apenas 63% do que recebem os trabalhadores não-negros na região. Esta desigualdade era pior no início da década, quando mulheres e negros recebiam, em média, apenas 58% da remuneração média de homens e não-negros, respectivamente.
Do ponto de vista das relações de trabalho e da negociação coletiva, a década termina de forma bastante positiva. As mais numerosas categorias de trabalhadores da região asseguraram reajustes reais de salários em percentuais históricos, como os metalúrgicos, químicos e bancários, além de garantirem participação nos lucros e resultados das empresas e com isso abocanhar parcela mais relevante do PIB regional. No setor público, que emprega cerca de 8% dos ocupados da região, com remuneração média de R$ 2.026, os avanços significativos se deram no estabelecimento de negociação coletiva permanente entre os servidores e as Prefeituras.
O fato mais promissor do ano, culminando uma década de intenso diálogo social na região, é a articulação no ABCD da primeira experiência regional de uma agenda de trabalho decente em sintonia com os conceitos e princípios desenvolvidos no contexto da Organização Internacional do Trabalho (OIT). Oficinas municipais e uma representativa Conferência Regional realizada em maio mobilizaram a região para os desafios de se garantir, por meio de políticas públicas e de acordos entre sindicatos de trabalhadores e empresas, trabalho produtivo e adequadamente remunerado, exercido em condições de liberdade, eqüidade e segurança, sem quaisquer formas de discriminação, que seja capaz de garantir uma vida digna a todas as pessoas e fundamentar um efetivo desenvolvimento regional.
Thomaz Ferreira Jensen, 34 anos, economista, é assessor técnico do DIEESE, atuando na subseção do Sindicato dos Químicos do ABC. Entre outros estudos técnicos, escreveu o artigo “ABCD do Trabalho Decente: aprendendo e ensinando uma nova lição”, em co-autoria com Nilton Freitas e José Freire da Silva, publicado na revista Bahia Análise & Dados