Aviões que passam despejando veneno contaminam corpos d?água, pessoas e plantações
Por Solange Cristina Ribeiro – Secretária de Meio Ambiente da CUT-SP
Sandovalina, pacato e aprazível município com cerca de 4.200 habitantes, localizado no Pontal do Paranapanema, interior paulista, é também protagonista de uma realidade nada animadora: o município é dono da maior taxa padronizada, no estado de São Paulo, de morte por câncer de pâncreas, segundo dados do Ministério da Saúde de 2000 a 2013. Assim também é o segundo município com maior índice total de nascidos vivos com malformações congênitas, também no mesmo período, além do registro de diversas doenças respiratórias e sem diagnóstico preciso.
O motivo para as alarmantes taxas de câncer de pâncreas e nascidos vivos com malformações congênitas é bem conhecido: os agentes causadores de tais males são os aviões das grandes fazendas monocultoras de cana-de-açúcar (e, em menor porcentagem, de soja) que realizam a pulverização aérea de agrotóxicos, principalmente de glifosato (o que chama muito a atenção, tendo em vista que não é recomendado o uso do glifosato em plantações de cana-de-açúcar). De acordo com a comunidade científica, o glifosato (vendido sob o nome comercial de Roundup, da transnacional Monsanto) pode causar: mal de Alzheimer, anencefalia em recém-nascidos, diversos outros defeitos de nascença, cânceres de próstata, pulmão, mama, cérebro, pâncreas, depressão, doenças cardíacas, linfoma não-Hodgkin, doença de Parkinson, dentre outros males.
Em Sandovalina, não é preciso fazer uma grande jornada para se encontrar relatos sobre os “aviões que passam despejando veneno” e contaminam corpos d’água, pessoas e plantações: bastante conhecida na região é a triste história dos produtores de seda que tiveram perda total de safras por conta do forte uso de agrotóxicos (pulverizados por aeronaves e carregados pelos ventos para além dos limites das fazendas monocultoras de cana) e da contaminação das amoreiras, que alimentam as lagartas que se tornariam o bicho-da-seda. Há, ainda, diversos relatos de contaminação e prejuízo de produtores de mandioca e hortaliças.
A Embrapa (Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária) já aponta, desde a década de 1990, que a pulverização aérea de agrotóxicos mesmo com condições meteorológicas ideais dadas pela instrução normativa nº2 do Mapa (condições de vento, pressão atmosférica, umidade relativa do ar, temperatura, etc.) faz com que uma quantidade considerável dos agrotóxicos pulverizados seja absorvido pelo solo, bem como boa parte do veneno atinja áreas circunvizinhas da aplicação por conta da deriva dos ventos (podendo chegar à 32 quilômetros de distância da área de aplicação). Há que se ressaltar, também, que esta instrução normativa estabelece uma distância mínima (insuficiente) entre a área a ser pulverizada com aeronaves e as habitações e os mananciais de água, sendo que há um jogo de empurra entre entes públicos que faz com que ninguém fiscalize tais atividades. Nesse sentido, a Abrasco (Associação Brasileira de Saúde Coletiva) recomenda que o poder público proíba a pulverização aérea de agrotóxicos.
Esta realidade mostra porque a Secretaria de Meio Ambiente da CUT-SP apoia toda e qualquer ação que vise barrar não somente a pulverização aérea de agrotóxicos, mas toda iniciativa que objetive acabar com o uso de venenos que contaminam a natureza, que fazem adoecer os trabalhadores que os manejam, bem como as pessoas que vivem nos arredores das áreas pulverizadas e aqueles que consomem os alimentos contaminados.
Assim sendo, damos todo o apoio para a aprovação e implantação da Política Nacional de Redução dos Agrotóxicos (PL 6670/2016), bem como daremos todo o apoio à Política Estadual de Agroecologia e Produção Orgânica – Peapo, no estado de São Paulo (PL Nº 236/)2017. Também dizemos não ao “PL do Veneno” (nº6299/2002) – que prevê diversas mudanças preocupantes na atual lei de agrotóxico (nº 7.802/1989), como a redução das necessidades de estudos de riscos, acelerando e facilitando a liberação de agrotóxicos atualmente proibidos e que causam graves danos à saúde (teratogênicos, carcinogênicos, mutagênicos), bem como a limitação da atuação dos estados no tema, dificultando que sejam criadas leis estaduais que restrinjam a utilização de agrotóxicos –; não ao PL 3200/2015 – que visa revogar a atual lei de agrotóxico (Lei nº 7.802/1989), e propõe a alteração do nome de “Agrotóxico” para “Defensivos Fitossanitários”, amenizando a publicização dos riscos que estes venenos trazem para a saúde humana e para o meio-ambiente –; e não à Lei nº 13.301/2016, que dispõe sobre medidas de controle do mosquito Aedes Aegypti e libera pulverização aérea de agrotóxicos nas cidades.
E reforçamos ainda que daremos nosso apoio para a aprovação do PL 53/2017, do vereador professor Padre Sergio (PT), que proíbe a pulverização aérea de agrotóxicos em Americana, interior de São Paulo. E, do mesmo modo em que participamos, em Sandovalina, do 2º Seminário Regional de Saúde e Qualidade de Vida do Pontal do Paranapanema neste ano de 2017, participamos, em Americana, de uma audiência pública na Câmara Municipal da cidade para apresentar nossas posições: a aprovação deste PL em Americana será um marco para a agricultura nacional e pautará o debate em outros estados e municípios que queiram barrar a pulverização aérea. Logo, não pouparemos esforços para incentivar sua aprovação.