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Artigo: Fome de paz

14/10/2020 às 11h42

Por Nilton Freitas, especialista em Relações Internacionais, representante Internacional de Trabalhadores da Construção e da Madeira (ICM) na América Latina e Caribe

Por Nilton Freitas

Um dos piores flagelos da guerra é a fome. Um mundo sem fome é um mundo potencialmente em paz. A fome gera conflitos de toda ordem: desde massacres étnicos e genocídios raciais até as mais singulares tragédias familiares, passando pela migração que atormenta os que acolhem e os que ficam para trás. No exato sentido inverso, onde há conflito, há fome: as duas guerras mundiais deixaram milhões de mortos em combate e outros milhões morreram de fome.

Tanto a Liga das Nações (1919) que dá origem a Organização das Nações Unidas (ONU), fundada em 1945, nascem ao final das duas grandes guerras mundiais e tem, entre seus principais objetivos, evitar o conflito e promover a paz. O Programa Mundial de Alimentos da ONU que acaba de receber o Prêmio Nobel da Paz de 2020 é parte expressiva desse esforço contínuo e se realiza no exato momento que o mundo sai de uma pandemia cujas consequências podem ser equiparadas aos de uma guerra mundial. Se estima que o número de pessoas em insegurança alimentar “severa” pode superar 230 milhões em 2021. Pessoas que não encontrarão meios para comer todos os dias, entre elas, crianças e mulheres migrantes e refugiados das secas e de conflitos étnicos e regionais, os mais vulneráveis.

Segundo a ONU, cerca de 20 mil pessoas morrem por dia em decorrência da falta de alimentos, muito mais que a média diária estimada de mortes por COVID-19.

As políticas de austeridade econômica que priorizam o sistema financeiro ao invés das pessoas e, os governos ultraliberais que priorizam o mercado ao invés dos trabalhadores estão na origem de muitos problemas sociais que resultam em mais fome, sendo o principal deles, o desemprego. De acordo com a Organização Internacional do Trabalho (OIT), essa situação se tornou ainda mais explosiva durante a pandemia do novo coronavírus, quando mais de 34 milhões de pessoas perderam seu posto de trabalho, alguns de forma definitiva.

A concessão do prêmio Nobel mais importante a uma organização multilateral do sistema internacional dedicada ao combate a fome representa uma forte mensagem de paz e solidariedade nesses tempos de ódio e de extremos, dominados por ideologias fascistas e pela intolerância que resultam em mais desigualdade, mais pobreza e mais violência. O mundo tem fome de paz, não de guerra.

Nilton Freitas, especialista em Relações Internacionais, representante Internacional de Trabalhadores da Construção e da Madeira (ICM) na América Latina e Caribe

 

O artigo foi escrito originalmente para coluna do site Rádio Peão Brasil